segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Andei por estes caminhos
de pura rocha derretida
e lava,
num mundo surreal,
onde a realidade
acontece nos únicos
10 minutos
em que o sol se traveste de lua!

Vi palavras que envolvem
pescoços das mais lindas
damas de argila,
banhadas nas florestas
de rios e lagos,
onde qualquer ilusão
não passa da mais pura realidade.

Sei que isto são sonhos
não de um mundo perfeito,
nem de um mundo ideal.
Mas sonhos do mundo real,
o mundo que sonho habitar.

Os mais estranhos animais,
praticando os mais estranhos rituais,
celebrando chuva e fogo,
neve, vento, brisa, plantas,
lagos, rios, o sal dos mares,
com suas marés tão mais azedas,
cobertas de fitoplanctons.

Tudo num perfeito acasalamento,
numa sintonia,
um rito ao mesmo tempo
sexual e não sexual,
contrastando com a perfeita
perfídia da alta sociedade
burrocrática e apática,
a fineza do silêncio,
a crueza da tristeza
e da escuridão da quietude
dos dedos empinados
de todas as alcoviteiras endinheiradas,
tão antinatural.

Viro animal, agradeço, suplico.
Vivo essa vida simples de acasalar,
de amar,
de gozar tantas tão simples coisas...
indo além de toda casta,
toda casa, toda morada,
sobrevoando pastos de pessoas
que alimentam sonhos ruminantes,
indo além de todo chiqueiro
repleto de jovens, velhos,
que pisam no chão
sem firmeza de suas próprias
merdas, tão calculadamente
feitas e pisadas.

E lá se vai todo esse primordial sentimento:
a raiva.
Vai, e vai para bem longe.
Essa gota de chuva me cai no nariz,
tão fria e tão limpa,
me faz sentir bem.
Ainda bem que já passou
já passou,
passou,
foi.

Poluição sonora

É quando tudo se cala,
tudo escurece,
tudo perece
que tu cantas.

Cantas para ver acender
naquela janela,
bem ali em frente,
uma luz carregada de
palavras urradas,
trovões loucos
e vozes roucas,
cheia de maldizeres,
rajadas e cortantes,
empurra para longe o silêncio
e vêem mais luzes,
tal qual vagalumes ordenados,
programados para iluminarem-se.

Esta cidade dorme,
e os sonhos nem sempre
são bons.
A lua compete com luzes dos postes,
insones.

As estrelas, esmaecem-se.
Viram nada, perecem na escuridão.
Há automóveis, longes.
Quando em vez, chegam perto
com a mesma rajada
a invadir nossos aposentos.

Esse teu canto, incompetente,
não acorda nada, nem ninguém.
Estão acordados, todos!
Estão a trabalhar,
a beber mágoas e alegrias
e a fazer amor.

Tudo, em silêncio,
essa é a regra.
Acordados em silêncio,
para não incomodar
esse silêncio!

E como acalma, como é bom.
Se cantares novamente,
palavras voltarão contra ti,
enraivadas e ecoadas.
Não grita! Me doem os ouvidos...
Vamos, temos uma noite a viver,
em silêncio, que amanhã
vem o sol com todo seu barulho.
Amanhã trabalham todos os ouvidos.

De manhã temos todos que gritar
para despertar uma cidade
já acordada.
Mas é a hora de quebrar o silêncio,
pois a luz já veio!

Aí acaba o amor,
a tranquilidade.
E assim, cada dia,
são dois:
o dia do barulho,
e o dia do silêncio!