quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

...ao longo do tempo

Grécia antiga:

-Oi, vamos transar?
-O que vão pensar de nós, Penilates?
-Ora, somos filósofos, Homolates. Não tem problema. Vamos?
-Para minha casa, então.

Roma antiga:

-Oi, vamos transar?
Todos, em coro, respondem:
-Siiiim, vaaaamoooos, Republius.

1300 dC.

-Oi, vamos transar?
-A Igreja não permite, a não ser para reprodução.
-Você vai ser queimada amanhã de manhã, de qualquer forma.
-Vamos arder no fogo, então.
-Da paixão?
-Também. Vamos.

Ainda na mesma época...

-Oi, vamos transar?
-Mas padre, as autoridades clericais não vão gostar disso.
-Santo Padre, por favor. O que me diz, Lucrécia?
-Perdão, Santo Padre. Vamos para o céu?
-Não, transar.
-Está bem.

1800 dC.

-Oi, vamos transar?
-Se conseguir tirar todos esses vestidos até meu pai chegar, vamos.
-Fiz curso em Oxford.
-Pode começar.

1920 dC.

-Oi, vamos transar?
-Mas nem sei de que família você é.
-Sou Magalhães, de sangue puro.
-Então meu pai concorda. Vamos.

2007 dC.

-Oi, vamos transar?
-Nem te conheço.
-Sou Marcelo (olha que bobinha, acreditou que me chamo Marcelo)
-Sou Érica (ele acha que acreditei que ele chama Marcelo. Otário)
-Agora vamos?
-Sim, já sabemos o suficiente.

200_futuro dC.

-Oi, vamos transar?
-De novo?
-Agora, podemos fingir que gostamos. Podemos até perguntar os nomes.
-Agora grudou. Pelo amor de Deus, não se pode nem fazer sexo que vocês já querem casar. Vou embora.

Doce aventura urbana

As pessoas estão cada vez mais cansadas da cidade. Isso pode parecer um pouco óbvio. Muita gente odeia o campo, é claro, mas as pessoas que não odeiam começam cada vez mais se mostrar interessadas em tudo que não é cidade.
Um bom exemplo para comprovar essa hipótese é o tipo de carro que tem-se vendido ultimamente. Todo carro que sai agora cuida para ter uma boa versão, geralmente completa, com um visual mais bonito off-road. Uma lista de exemplos: a pioneira Palio Adventure, Idea Adventure, Ecosport, Peugeot 206 Escapade, Fiesta Trail, Parati Track & Field (mais surf do que aventura), Crossfox, Citroën C3 Xtr. Deve ter algum de que me esqueci.
Até as propagandas de pick-ups cabine dupla, um misto de carro de família-fazendeiro, obviamente, ricos. Sempre estão subindo terrenos difícieis de serem alcançados até de helicóptero. Com alguém fazendo muito esforço, comparando a pick-up com uma pessoa "raçuda". O tema geral? "Superar obstáculos", "superar desafios", "raça forte", "você pode confiar". Agora ainda colocam temas de rock como "We will rock you", do Queen e "Song 2", do Blur. Ainda colocam tribos africanas não descobertas. Tudo igual. Com algum mérito para a Ford que começou tudo com a "Raça Forte" da Ranger e da F-250.
O fato é que as pessoas gostaram da idéia, e as propagandas venderam bem. Realmente é gostoso ver pessoas se divertindo acampando em uma praia deserta, ver uma pick-up de 3 toneladas completa passar por um rio jogando água para todo lado. Liberta-nos do urbanismo. Até aí tudo bem. O problema é que ninguém, em sã consciência, colocaria uma Hilux de mais de 100.000 patacas numa trilha que ela não foi feita para. Não, não foi feita. Nem o Ecosport para andar em terrenos difíceis, muito menos os outros, mais baixos ainda, sem tração 4X4 nem nada. As pick-ups, no máximo, andam muito bem em estradas de terra acidentadas. Não confie nas trações que na verdade, imitam as trações 4X4 mecânicas. Vá apenas para a sua fazenda, não vá fazer o Rally Dakkar sem modificá-la. Mas as pessoas gostam da idéia de se libertarem da cidade, das preocupaçõe urbanas.

Só não me lembro de pessoas que adoraram as propagandas e os carros saírem com eles para algum lugar onde não se encontra um supermercado a mais de 50 km.

Estar sozinho

Por duas vezes mudei minha rotina de uma forma um pouco mais abrupta que o comum. Em 2004, me mudei do interior de Goiás (Goianésia) para a capital (Goiânia). Pensei várias coisas, se tinha feita a escolha certa com relação ao colégio, se teria amizades tão boas. No início do ano, mudei de Goiânia para Campinas, mais abruptamente ainda. Tive que decidir entre me mudar para São Carlos com um amigo ou se me mudaria sozinho para Campinas. Como me interessei mais pela Unicamp do que pela Usp, acabei ficando em Campinas, a princípio, sozinho.
Acabou meu primeiro ano letivo, muitos medos que eu tinha no começo cessaram. Vou me mudar de novo, mas apenas de casa. Nunca foi algo muito significativo para mim mudar de casa fisicamente. Me adapto bem a novos locais. O problema é que acabei fazendo bons amigos mesmo na minha casa (com 16 pessoas, faz-se boas amizades). O problema é sempre esse. Em Goianésia, tinha muitos bons amigos. Em Goiânia, fiz outros bons. Em Campinas, outros. Em casa, outros. Alguns não vão mais morar comigo, fiz opção por morar com mais dois amigos, apenas.
Sempre faço bons amigos, pelo menos assim considero. Não que eu seja um exemplo de popularidade, mas tenho certeza de que os amigos que tenho são bons amigos, valorosos. Resolvi, não sei se por acaso, me perguntar se sempre tive sorte nas minhas escolhas. Se eu tivesse ido para outro colégio, teria eu tido amigos tão bons em Goiânia? Eu me sentiria tão bem na Usp como me sinto aqui? Claro, não me pergunto para saber a resposta, ou me decepcionaria sempre ao pensar que nunca saberei a resposta. Sendo acaso ou não eu me sair tão bem nessas mudanças, me considero com muita sorte.
Se basta eu me mudar e fazer novos amigos, manter os antigos, apesar até da distância, tenho muita sorte. Fico triste em saber que tantas pessoas passam a vida inteira sozinhas. Aliás, tenho pena das que passam a vida inteira sozinhas e não escolheram isso. Bem que essas pessoas que vivem sozinhas deviam se encontrar e passarem a não ser mais sozinhas. Talvez se essas pessoas fossem mais felizes, o mundo em geral fosse um pouco mais feliz.

Filme que gostaríamos (pelo menos os homens) de ver


Preconceito é não fazerem a versão feminina. Essa modinha de achar que homossexualismo é cult só serve para homossexuais homens?

sábado, 8 de dezembro de 2007

Diálogo dos nomes

-Bom dia! Olhe como o dia está lindo...
-Bom dia... nossa, realmente. Que horas são?
-Que outra hora do dia o sol pintaria de um dourado tão bonito as nuvens? São 6:30.
-Tanta poesia para responder as horas?
-A poesia em tudo se deita. Por que não nas horas? Ainda mais com você ao meu lado...
-Acho que alguém vai acabar ganhando um prêmio especial hoje.
-Mais um?
-Se continuar assim...
-Então gosta da minha poesia?
-E não era para gostar?
-Se achar boa, fique à vontade. Vou fazer um café. Acho que tem pão-de-queijo para aquecer.
-Vamos descer então.
-Só uma pergunta antes de descermos, posso?
-Fique a vontade.
-Qual seu nome?
-Anna Lúcia. O seu, se me lembro, Marcelo. Me enganei?
-Sim.
-É Marcelo ou me enganei?
-É, se enganou. Sou Ricardo.
-Acabou a poesia?
-Sim. Acho não devia ter perguntado seu nome. Era mais interessante o mistério.

Silêncio. Ficam um bom tempo sem falar uma palavra sequer. A Voz de Ricardo quebra o jejum das ondas sonoras no quarto:
-Ainda mereço o prêmio?
-Não sei. Não tenho mais fome. Acho que vou embora.
-Tchau então. Te vejo outra hora?
-Só se esquecer meu nome. Adeus.
-Adeus. Foi muito boa a noite.
-Sim, sim.

Muitos anos depois:
-Oi. Lembra de mim?
-Sim, mas fugiu-me seu nome.
-Ainda bem. Vamos para minha casa?
-Adoraria. Ainda lhe devo o prêmio.

sexta-feira, 7 de dezembro de 2007

História com música (remastered)

Nascido em 1947. Viveu no período conhecido como pós-guerra, onde os medos eram mais comuns do que em qualquer outra época, talvez com a possível exceção da época de guerra. Principalmente se se fosse um europeu, o que não era o caso de Paulo. Brasileiro de nascença e de sangue, bem mestiço.
Em 1964, conheceu o "Please Please Me", dos Beatles. Em 1966, conhece o "A Hard Day's Night", que representava muito bem seu espírito. Amor conjugal, inocência, despreocupação, simplicidade. Com os anos, e junto com os álbuns dos Beatles, amadurecia. Em 1969, já estava vivendo uma fase em que mais pregava o amor incondicional entre todas as nações e povos. Gostava de se perder em toda a psicodelia do momento.
Contudo, essa fase não tardaria a passar. Os Beatles, em 1970, passaram a ser um mito, que não mais existia. Esse mito de "paz e amor" deixaria um vácuo ocupado por qualquer coisa mais lenta, que não tinha um espírito em si, apenas o de ars gratia ars: a arte pela arte. Em 1973, já com 26 anos, Paulo buscava nas músicas não mais coisas sobre o mundo, apenas o entretenimento. A música passou para outro plano. Não só no estilo, mas também como Paulo a via. Descobriu o "Meddle" e o "The Dark Side of the Moon", Pink Floyd. Descobriu o "Selling England By the Pound", do Genesis. Admirava os solos, lentos, longos, arrastados com uma melodia que parece ter sido inspirada à beira do mais brando dos rios, que faz-nos sentir qualquer coisa de puro, uma sensação de que seus órgãos todos agradecem, e seu cérebro nos enche de substâncias prazerosas.
Acompanhou as bandas progressivas até sucumbirem à falta de paciência dos novos ouvintes para os 15 minutos de música, ou para a nova tendência pop. Genesis, Supertramp, até o renomado Yes, caíram no pop. O Pink Floyd se salvou do pop e das monstruosas músicas, mas não sobreviveu a ele mesmo. Paulo parou no tempo. Não quis saber de nada novo dos deprimentes anos 80, ultra-alternativos ou ultra-pops. Regrediu. Nada mais significava algo para ele. Nenhuma música parecia se encaixar no mundo dele. Passou a buscar as músicas mais antigas, dos tempos de infância, do que lembrava de ouvir seus pais escutando, os boleros, com aqueles vozeirões, o jazz e o blues.
Quanto mais velho ficava, mais buscava o passado. Talvez até o passado dos seus pais. Esqueceu-se de que já vivia quase no século XXI. E Chegou até o século XXI. Mas já era tarde. Não sabia mais acompanhar o momento. Esqueceu-se de como era estar em fase com tudo, principalmente com músicas. Criou todo um preconceito com os novos estilos, sem nunca ter tentado escutar nenhum. Nem reparou nas novas bandas que imitam os velhos progressivos. Perdeu boa parte da sua vida, apesar de ter vivido num tempo em que as músicas correspondiam exatamente ao amadurecimento de um jovem normal, desde a inocência, a "porra-louquice" da adolescência, a maturidade e a serenidade. Perdeu-se em algum lugar entre os anos 80 e 90. Daí para frente, só restaria a ele se tornar um velho ranzinza. Chato.

segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

História com música

Nascido em 1947. Viveu no período conhecido como pós-guerra, onde os medos eram mais comuns do que em qualquer outra época, talvez com a possível exceção da época de guerra. Principalmente se se fosse um europeu, o que não era o caso de Paulo. Brasileiro de nascença e de sangue, bem mestiço. O que não muda em absolutamente nada a história. Mas a enriquece um pouco. Conheceu, no ano de 1964, o primeiro disco dos Beatles, já comemorando o segundo ano desde o lançamento na Inglaterra. Curiosamente, a música pegou-o na fase em que mais ela tinha a ver com Paulo. Ingênua, divertida, que passa de agitada para baladas românticas. Com seus 17 anos, era tudo o que ele via. Um mundo ainda bonito, em que o amor conjugal era soberano.
Claro, ainda mais para um nascido num mundo que se preparava para a Guerra Fria, e que acabou de ver bombas atômicas, talvez se perdesse um pouco da ingenuidade. Mas quem não viu, só ouviu falar, se lamenta, não compreende tanta maldade, ainda mais crianças. Acaba que não se perde toda ingenuidade, talvez nem um pouco dela. Talvez essa recém chegada geração aprendesse a amar mais intensamente, ou simplesmente viver tentando se afastar de toda essa crueldade passada. Por isso acredito na ingenuidade dessa geração.
Com o tempo, passou "A Hard Day's Night", com as mesmas idéias, de "And I Love Her", "Can´t Buy me Love". Pouco depois, vieram os Rolling Stones. Trouxeram uma nova atitude com eles. Mudaram também até os Beatles, e logo passaram do momento ingênuo para o psicodélico, numa transição muito rápida. Paulo acompanhou. Gostou das mudanças. Ele, afinal, também mudara. Já não era aquele jovem que acreditava em tudo. Tinha já seus 19, 20 anos. 1967 marcou o início uma época inexplorada, totalmente. Já dessa época, no Brasil havia chegado o Revolver. Continha um pouco de crítica. Paulo já gostava de criticar. Era o Médici. Nunca chegou a ser preso, mas não concordava com a Ditadura. Mas nunca chegou a ser militante. Em 1969, já estava no espírito de paz e amor. Liberdade. Era absolutamente complacente com o movimento Hippie. Gostava da psicodelia, dos discursos de amor. Mas um amor mais transingente, não do tipo conjugal. Do tipo amor ao próximo, quem quer seja ele.
Nesse ano, conheceu muitas coisas. Conheceu o Sargent Peppers, Magical Mystery Tour e algo um pouco diferente. Era o "The Piper at the Gates of Dawn", do Pink Floyd. Diferente. Mais psicodélico que os outros. Gostou de todos, mas se identificou muito com o Pink Floyd. Conseguiu ainda um "Abbey Road" importado. Foi o melhor dos anos, até então. Vivia com amigos, curtindo toda a época da psicodelia, do lisérgico.
E como passou rápido. Em 1972, já buscava coisas bem menos psicodélicas. Acabaram todas as obras novas psicodélicas, bons morreram de overdose, chocando muitas pessoas. Começou a trabalhar de verdade. Já tinha 25 anos, devia crescer. Continuou a escutar Pink Floyd. Eles também acompanharam as mudanças. Os Beatles já eram, só se tinha quatro fragmentos, que ainda muito brilhavam, mas que não era o mesmo diamante de antes, absoluto. O novo som do Pink Floyd era mais calmo, mais trabalhado. Não era necessariamente melhor ou pior, mas diferente dos Beatles. Em 1973, veio o "The Dark Side of The Moon", veio o "Selling England By the Pound", do Genesis, foi a era de ouro do progressivo.
E de progressivo viveu os anos 1970. Não chegou na fase Punk. Já tinha passado da idade de ser Punk. Viveu outros tempos, não fazia mais sentido para ele. Era uma pessoa serena já, madura, não muito rebelde. Caia-lhe bem o progressivo, apreciar as guitarras lindíssimas. Acompanhou todas as bandas até o começo da década de 1980. Depois, mudaram muito. Os instrumentos eletrônicos tomaram conta. Não os eletrônicos órgãos de Rick Wakeman, mas os eletrônicos de música pop. As batidas eletrônicas. Mesmo em bandas como Supertramp, Yes e Genesis. O Pink Floyd acabou, mudou, ficou estranho. Até se recuperou mais tarde, com o "The Division Bell". Parou de acompanhar a música da época.
Em 1983, quando ainda acompanhou o "The Final Cut", do Pink Floyd, já tinha 36 anos. E acompanhava as músicas que eram lançadas. Mas foi justamente nessa época que tudo mudou muito. Bandas excessivamente alternativas, ou excessivamente pops. A partir daí, comprar discos de lançamento era coisa de quem tinha até 25 anos, e olhe lá. Poucos ex-fãs de Beatles comprariam um disco do Depeche Mode, ou do The Smiths, ou do The Cure. Começaram a dizer que a música boa ficou para trás. Os jovens, pelo contrário.
Paulo, entrou em outra fase musical. Começou a regredir. Não em qualidade, mas em cronologia. Nada mais de lançamentos. Começou a investir em discos mais nostálgicos, de músicas dos anos 50, ou até 40, das que lhe traziam lembranças de seus pais, ou da sua infância. E quanto mais o tempo passa, ele se distancia do atual, sua mente começa a trabalhar em função do que já foi, e cada vez mais ele culpa o presente pela falta de gosto, mas esquece da provável dificuldade que seus pais teriam em escutar os próprios Beatles, ou os Rolling Stones. Cessou de conhecer coisas não necessariamente novas, mas que fossem ao menos novas para ele. E joga toda a culpa nos jovens, que têm, segundo ele, péssimos gostos musicais.
Talvez nos esqueçamos de viver o momento, mas não falo de "Carpe Diem". Como Paulo, esquecemos de viver o que está acontecendo, de ficar para trás no tempo, culpando o mau gosto do atual, sem tentar, ou mesmo tentar e deixar de lado o que tem nas novidades. Não abrir mão do seu tempo, mas saber que o tempo é sempre mutável, e que, apesar de não parecer, ele deseja que o acompanhemos, para que ele continue a fazer sentido. Vamos aproveitar o que já não foi, e o que está sendo. Ter glórias do passado é bom, mas melhor é saber ser ainda possível construir qualquer coisa a mais do que o que já foi deixado.

PS.: Um texto que perdeu um pouco do que eu quis dizer ao longo dele, e acabei modificando o mote dele. Acho que fiz inspirado em experiências próprias, pessoais ou nem tanto. Fato é que perdeu bastante do que seria de como imaginei. Não consegui fazer como imaginei.