sexta-feira, 11 de julho de 2008

Um fogo-fátuo, uma miragem

Aqueles olhos que passavam o dia a me vigiar!
Ainda que não pudesse manter os olhos em mim, sei que eu era obviamente vigiado. Cada vez mais a vigilância não cessa, não cede, não quero que ceda.
A verdade é que hoje não acordei pra poesia, apesar de uma certa fluência na minha materna língua.
Só sei que, desses olhos flamejantes, não escapei. Ainda bem, não escapei. Vermelhos, na verdade, não. Mas lindos, sem dúvida. Em toda essa brancura, tão alva, esconde o impecável sorriso, esconde os contornos que a mim, me parecem simétricos. A outra metade da simetria reside em mim. Os cabelos vermelhos, obviamente, tudo é falso. Não menos cativantes. Não menos poderosos, entretanto. Enlaçam-me, deixam-me perdido, me acham.
Não sei o quê, mas tem algo nessa foto de mais especial que muitas outras. O olhar um pouco egípcio, um pouco ainda dotado de adjetivos não presentes nos dicionários, mas, indubitavelmente bons adjetivos, dão um leve aroma à foto, como uma cor de alguma especiaria que nos faz sentir um gosto bom. Nada, portanto, impede de se sentir um gosto bom ante uma bela visão. Ou um belo cheiro inerente à própria imagem planificada de delineações sublimes, unicamente criadas e trabalhadas, artesanalmente, certamente provinda de algum cristal fino, que por descuido, se juntou ao barro de alguma costela de algum Adão, e formou algo tão sensível, quebradiço, mas que, pelas minhas mãos, hão de ter o cuidado necessário para que se resista à maior intempérie possível; hão de saber o sabor de um cuidado, um sabor de qualquer coisa que traga alguma felicidade, momentânea, mas um momento que não pode ser repetido e que na memória, entretanto, não pode cessar de existir, de ser e de se recriar.
Tudo isso nas cores, sons, formas, odores e tatos que o homem pode perceber. Há ainda tantas outras dimensões, ultra-violetas, sub-aromáticas, super-doces que só através de um poderoso sensível equipamento pode-se perceber: cumplicidade!

Muda?

-Muda alguma coisa?
-Se mudasse, estaria tudo diferente!
-Mas pode ser que ainda não mudou!
-Mas ah, o tempo antes de nós foi grande, não muda mais!
-E o tempo além?
-Garante-me que há?
-Não.
-Se mudasse, teria mudado! Se achamos que muda, o tempo que se passará antes da mudança será suficientemente grande para apagar a mudança, torná-la miserável, infinitesimal, como gostam de dizer matemáticos.
-Então não muda?
-Não haveria por quê mudar! O tempo desmuda! Sempre!

Um texto de não-sei-quê

Se não é a morte que nos assusta tanto, talvez seja a vida, pois!
Passo um bom tempo a assistir vídeos, clipes, ouvindo minhas músicas favoritas, sendo que uma boa parte, possivelmente, duas, três, quatro, cinqüenta, cem vezes mais velhas do que eu.
Me fazem pensar em tanta coisa, e muitas vezes perco bons pensamentos acreditando que começo a pensar outro melhor, mas aí o antigo, depois que percebo sua qualidade superior, me foge como foge um peixe, esguio, de nossas mãos ao tentar tocá-lo.
Assisto a várias bandas que meus pais ouviam, ouço-as com ouvidos novos, embora sejam sons antigos. Sons que possivelmente começaram a mudar o mundo antes mesmo que eu começasse a me entender como uma alma que se preparava para adentrar a penosa, porém não menos agradável, vida terrena.
Vejo tantos mortos que me comovem, me movem, mudam a batida do meu coração, e mais além ainda, mudam meus passos ao caminhar. John, Freddie, George, Syd, até Elvis, dentre muitos outros. Vejo lugares que nunca estive, mas sinto como se de lá emanasse parte da energia que me sustenta como ser ativo de algum restrito meio cultural do qual tento fazer parte e do meio social ao qual tento convidar muitos.
Não sei bem qual foi o meu intuito ao escrever isso, mas me saiu de modo que minhas entranhas não suportavam todas essas palavras juntas. Talvez fosse uma homenagem à grandes defuntos, que agora pagam pela vida que tiveram, como um dia hei de pagar, e, assim, toda minha energia esvair-se-á de modo que, no sono eterno, estarei preso não mais a um corpo, mas a uma forma estranha de energia que foi sinceramente criada, recriada, descomportada, divulgada e transferida por honorários defuntos ou pré-defuntos, onde leis e físicas não se aplicam, onde o som é, sim, uma onda, uma vibração mas que tem muito mais a ver com coração que com meio de propagação.
Seres propagantes somos nós. Em propaganda veloz ou até mesmo na mais lenta, porém duradoura, levamos adiante a fim de talvez lembrarmos de nossos tempos, quando vagarmos sem rumo, talvez fátuos, talvez disformes, levianamente descuidados com a realidade dos vivos, nos assustando cada vez mais com essa vida, cada vez mais preocupada com coisas que, no nosso tempo, e nos de nossos antepassados e dos sucessores da presente geração, não pode nos fazer nenhum sentido, e assim, dizendo sempre a frase: "no meu tempo..." - um tempo que jamais existiu, não fosse pela dubiedade que nos obrigamos a nos expor, esquecendo-nos que o nosso tempo não é nosso, mas, de alguma forma, devemos muito a quem tenta construí-lo, esses nossos defuntos, moribundos ou não, pioneiros ou não, mas que nos marcam, levam nosso presente a quem, um dia, o achará estranho, aceitando-o por quê, afinal de contas, tudo tem sua beleza.

quinta-feira, 3 de julho de 2008

Home, sweet home!

Tem dias
em que a simples casualidade
da existência nos tira a vontade
de nos levantarmos da cama.
E sempre no inverno, que tem frio.

O fato de, por acaso, existirmos
naquele momento chega a incomodar.
Não queremos, por um momento, ser.
Muito menos pensar.
Bom mesmo seria estar em outro lugar,
mas não seria eu,
pois estou aqui.

Estar por acaso
diante do mais belo ocaso
e sentir isto ser incapaz
de despertar algum nervo,
algum axônio, alguma terminação nervosa
ou algum receptor
acordar e nos dizer:
olhe como isto é lindo,
fique possesso de prazer!
Mas ele só percebe:
como está frio! Entre para casa!

Resignado, me vou.
Não para minha verdadeira casa,
mas minha longínqua casa,
onde não sinto nas paredes
o aconchego,
onde não há colo,
onde os móveis não podem,
em hipótese alguma,
ter um lugar certo.

Não, queria mesmo é não ser eu,
estar longe,
estar perto não da distância
e sim do conforto que só mesmo
minha verdadeira casa me dá,
minha família, amigos.

Já fugi de casa, agora quero o colo,
cansei de voltar depois das 3,
e de liberdade.

Quero ir para casa!