quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Eu, eu mesmo

Hoje me senti bem. Estava sentindo algo que eu havia esquecido alguns anos atras e que mal sabia o sabor. Me senti bem dentro da faculdade, assisti a uma aula que nao gostei com algum pos-doutor sabido. A aula era chata, sem duvida. Didatica zero. Mas ainda assim a sensacao foi muito boa, de verdade. Talvez uma nostalgia, talvez a impressao de que o ano realmente comecara. Deu vontade de ligar para varias pessoas, mas como sempre, nao liguei. Queria contar que estava feliz, e as pessoas perguntariam: "serio? Que bom! Mas por que esta tao feliz?" - e exatamente ai meu plano falharia. Jamais saberia explicar por que e com certeza a conversa agora passaria a ser constragedora, com pensamentos quebrando as vozes em silencios compassados e transparentes. Ate mais transparentes do que se dissem: "endoidou".
Loucura ou nao, me senti como que aliviado, como se estivesse cercado de amigos em um momento dificil. Sei que poderia contar com todos eles, mas o dificil mesmo e' contar comigo. Desconfio de mim a todo momento. Cada segundo minha energia se divide em duas: manter-me vivo biologicamente e me policiar - se nao eu, quem mais? Sinto que devo comecar a ler outro livro, algum Erico Verissimo ou algum classico mundial, algo que me deixasse tao confiante de minha cultura que me fizesse esquecer de mim mesmo, desse policiamento ditatorial.
Divagacoes a parte, me sinto feliz pelo dia de hoje. Trabalhei, criei um pouco, refiz as pazes - pelo menos por enquanto - comigo mesmo.

terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Incontido

Cansei da minha hipocrisia
e de minh'alma lavada,
meus pecados perdoados,
nao sou assim,
nao mereco perdao nem respeito,
nao passo de um trapo,
um Eugenio que se deixou perder
por um punhado de tostoes.

Quanto mais me pergunto
por que eu tenho que ser assim
mais me afasto
do homem que costumava ser.
Onde esta minha familia?
Cade meus filhos e meus planos?
Diluidos em tantas outras preocupacoes
que nem me lembro mais
se sou Cavalcante ou se sou Oliveira,
ou Silva
(acho que nenhum).

Sinto o amargo da distancia,
sei ate que os ventos e as estrelas
sao os mesmos onde quer que os sinta
ou os veja,
mas isso nao basta.
O calor se perde no caminho,
as vozes se perdem,
o brilho esmaece e o opaco predomina.

Tudo que eu nao disse
hoje resolveu dar brecha
e apontar meu futuro:
um tiro no escuro,
um alvo desfocado.

De que adianta tudo isto
se tudo que eu sempre quis
esteve tao perto da minha mao direita
que o seu calor me fazia suar;
tao frio que sentia nao so o tremor
mas a dormencia em meu corpo todo,
e tudo nao passou
de uma vontade de deixar tudo para o futuro
que o futuro se resolva
- e que se exploda, se for preciso -,
mas que nada me permita
perder este sentimento de culpa
que vem toda noite
se deitar ao meu lado,
ouvir meu ronco
e debochar dos meus sonhos.

sábado, 12 de fevereiro de 2011

Verônica

Fui pago, não nego,
fui pego, mas fujo.
Juro que jamais a conheci,
foi lance de sorte
ter te encontrado até,
apesar de um pouco de azar
nessa situação toda.

Tentei escrever todo amor
que a simplicidade pode conceber,
mas nem isso consegui,
não sou simples assim, queria ser mais humilde.
Rebusquei demais, falei demasiado.

Busquei você na minha mente,
mais do que imagina,
dei vida, dei forma, dei poema.
Até daria a alma, mas foi vendida.
O que se vende não pode mais se dar.
Mas vendi você,
e acho que vendi caro até.
Não pagaria tanto
por tão pouca imaginação.

Até escrevi prosa em verso
e matei a gramática.
Matei Drummond, matei Baudelaire,
matei muita gente, e gente grande,
gente boa.

Me pediram e eu fiz
um poema para uma tal de Verônica,
Verônica dos lábios de pimenta
e de peitos de sedução,
de coração de ouro,
de cabeça firme,
de olhos que me davam a segurança
de um dique, a segurar tudo atrás de si.
Me pediram, foi isso.
Me pagaram, confesso.

Juro que sempre a amei,
mas jamais foi você mais
do que minha imaginação adubada
e um cachê barato
que gastei com whisky
a fim de criá-la.

A Caixa Mágica

Minha caixa mágica
que guarda muitos sonhos
muitos poemas,
guarda lembranças
e muitas coisas que nem imaginarei
que poderei ver.

Sim, possuo uma caixa mágica.
Que não é só minha, por sinal.
Acho que não poderia ser mágica
se fosse egoísta.

É como um carro, um transporte,
mas para dentro de mim.
É como o contrário da caixa
que pobre Pandora abriu.

Não é a toca de Alice,
é só uma caixa,
mas ali me guardo,
ali me tenho, sei onde estou,
ou às vezes até quero me perder
e faço da caixa meu labirinto.

De tão mágica, ela muda de humor.
Fica feliz quando estou triste
para eu me sentir melhor.
Fica triste quando estou feliz
para me lembrar que ainda vou doer.

Não digo que ela me mantém vivo,
pois ainda tenho em mim
meus músculos, meus ossos,
meus nervos à flor da pele,
meus nervos gélidos e insensíveis,
meu sangue azul e meu sangue roxo,
sangue verde, até amarelo,
tenho meu peito que tenta explodir
setenta vezes por minuto (assim dizem).

Enfim, sou bomba,
sou sentidos, sentimentos, raciocínio,
sou força,
mas também tem a minha caixa mágica.
Colorida por fora,
cobreada por dentro, sóbria,
mas mais na aparência.
É ali que descubro
se estou perto do lugar longe que sempre quis chegar.