quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Droga do Cotidiano

Tenho um profundo medo de desinteressar da vida. Algumas vezes acordo, ainda com sono, sei que tenho coisas a fazer. Às vezes nem tenho, mas invento, afinal, o dia tem que ser preenchido. Fui ensinado que não fazer nada é desperdício de tempo. Mas e quando o dia anterior foi sensacional? Aquela sucessão de acontecimentos que se encaixaram como cada uma das pedras das pirâmides deixaram escritas e pintadas memórias que só poderiam surgir da cabeça de mestres. Só o que resta é acordar no outro dia fomentando uma falsa esperança de que todo dia pode ser assim. É aí que se chuta o pé da cama ou o pé da mesa. É aí que o jogo vira.
Em milésimos de segundos e microgramas de neurotransmissores percebo o que acontecerá em diante: esquecerei a conta que eu deveria pagar em casa, ficarei preso no trânsito e me sentirei mal por ter me atrasado para o trabalho.
O que acontece é que ao mesmo tempo que acredito estar vivendo os melhores anos da minha vida, parece que também cada vez mais acho qualquer novidade déjà vu. É como se no primeiro dia eu aprendesse a beber e me apaixonasse pela embriaguez e entre com muita sede ao pote, literalmente. Daí vem o segundo dia, vem a ressaca e a vontade de que o mundo se exploda e só volte a existir no terceiro dia. Daí no terceiro dia já nem tenho mais tanta sede. É só vontade pois sei que eu gosto. E não porque descobri que gosto, ou porque estou sentindo o quanto gosto. Eu sei. E isto apodrece tudo. Agora sei que gosto de viajar, sei que gosto de assistir a shows, sei que gosto de sexo. Mas tudo já perdeu o tom de novidade. Tenho medo que eu sinta cada vez menos as coisas. É realmente uma droga parar para pensar nas coisas. Tem até os mesmos efeitos de drogas. Primeiro, um medo de experimentar, depois uma sensação de êxtase e, por fim, uma depressão depois que acaba a parte boa.

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