sábado, 5 de setembro de 2009

Alcebíades Vaz de Carvalho

Acordou morto. Obviamente que não acordou, pois estava falecido, por assim dizer. É só que amanheceu o dia e estava lá, prostrado na cama já com alto sol - e ele, então, que sempre acordou antes das 5. Totalmente inesperado. Sem sinais de doença, ataque fulminante, cataclismos nos pulmões, edemas, e muito menos derrames. Parecia uma vida que tinha mudado de idéia. Simplesmente tomou o outro rumo - o oposto.
Era daqueles que sabiam usar o tempo. Tinha uma boa empresa, no cafundó de algum interior. Custo de vida barato, simples, era conhecido e respeitado na cidade. Usava um chapéu e, apesar da simplicidade, detinha bons capitais. Saía de tarde da empresa, encontrava alguns funcionários para uma cervejinha. Aos finais de semana, um futebol com os diretores da empresa. Nas férias, viagens breves e bem aproveitadas para o exterior.
Não se sabe como e nem onde, endividou-se. E aí deixou morrer-se. Nunca deixou ninguém saber - confiavam nele. Ele adorava que as pessoas se apoiassem nele. Mas os que sabiam ser amigos. E, sendo o ágio extremamente ágil, faleceu de maneira que os Sicilianos de Puzo sentissem inveja dos projetistas de tal arquitetura.
Uns, diziam, com todo o pesar que sentiam por quem os tinha acolhido, algo meio que assim: "Abutuô o Palitó. Por quê é que dexô a gente sem nem avisá? A gente fazia uma dispidida bem bunita". E até podia se ver um brilho ocular seguido de um filete de água que lhes caía das vistas. Outros, enquanto isso, diziam: "Veio a óbito nosso saudoso amigo, dono não só de patrimônios, mas de corações. Devemos agora continuar seu sonho, redividindo a empresa, fazendo-a crescer como ele gostaria de ter feito em vida". De modo todo cerimonioso e solene, como um locutor de rádio que anuncia alguma morte. Uns, tomavam com ele cerveja. Outros, jogavam futebol. Uns, nem sabiam falar corretamente. Outros, só sabiam de cerimônia - que, neste caso, é sentimento só para inglês ver!

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