segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

A Casa

Antes, o lugar era um nada.
Era uma pradaria, uma relva.

Significava nada, nada.

Até que vieram as primeiras famílias.
Passaram por perto as primeiras ruas.
Naquele lugar tão simplório
de pôr-do-sol tão lindo,
completamente bucólico,
construiu-se uma casa,
um lar.

A criança chorou
ao ter que deixar a casa.
Gostava demais dela,
as brincadeiras tão peculiares
da geometria mal arranjada
de seus cômodos;
onde mais as brincaria agora?
Em outro lugar desconhecido?

Aí vieram outras famílias.
Até moradores sozinhos.
Para alguns,
era aquela casa a vida.
Para outros, apenas um teto.

Os prédios cobriram-lhe a vista
outrora tão exuberante
do crepúsculo.
As ruas tranquilas (antigamente)
enervaram-se, expulsaram
as brincadeiras tão inocentes
das crianças.

A casa continuava lá.
Algumas pequenas mudanças,
mas o que mudava mais
eram seus moradores.
Cada um sentia um apego diferente.
Era o aconchego,
ou então era a falta de espaço
para entulhos desnecessários,
ou até mesmo o rangido da porta do quarto,
indiscreto na manutenção da privacidade - em tudo
se pode apegar...

Mas ninguém pensava
que antes dos prédios,
era só uma casa simples,
uma ilha cercada de ruas tranquilas.
Antes, havia o pôr-do-sol.
Antes, nem casa havia.

Era uma relva, uma pradaria.
Onde homens já cruzaram
em busca da caça do dia,
sem empregos, sem contratos, sem papel,
sem democracia, sem nada.
Homens e mulheres nus.
Naquele pedaço de terra,
minúsculo,
já tantos sentimentos foram provocados...


 A mudança é só um ponto de partida
para que outros cheguem renovando os ares,
com móveis e perspectivas novas,
novos sentimentos - tudo passageiro.

A casa, pode não continuar lá.
Mas aquele pôr-do-sol (mesmo escondido)
ainda fica em algum lugar por ali,
aquela terra ali por debaixo,
que sustenta tudo acima de si,
continuará ali a ver tudo que acontece.
Por um tempo tão grande
que pode até ser chamado
de eternidade.
Mesmo que um dia acabe.

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